sexta-feira, 2 de novembro de 2007

[ranking mostra]

Stress. Filas. Atrasos. Cafés. Correria. Aventuras em São Paulo madrugada adentro.
Ah, e filmes. 16 filmes em cinco dias de mostra. Cinco dias conversando e ouvindo apenas sobre cinema, cinema, mais cinema.
Nem todos os filmes que assisti foram bons, mas tudo valeu a pena. Fica a memória de alguns e a certeza de que essa foi a primeira de muitas mostras. Abaixo, em ordem crescente de importância, a lista dos filmes vistos nessa temporada.




16º) Estômago - Marcos Jorge


Há uma certa tendência no cinema nacional em fazer comédias populares, para atingir uma maior parcela da população e cumprir o papel de aproximação entre arte e massa. Mas na maioria das vezes a receita não dá certo, e Estômago não foge à regra. Comédia boba, bem boba, personagens rasos, roteiro fraco e previsível.
João Miguel está bom, mas apenas repete a sua atuação, em um papel que parece que ele vai interpretar para sempre.
Se esse fosse realmente o melhor filme nacional da temporada, como foi eleito no Festival do Rio, estaríamos com sérios problemas.




15º) A amada - Arnaud Desplechin

Que bem existe em se ter um cineasta no núcleo familiar? Bom, se você um dia vender sua casa, pode fazer um documentário de luxo, sobre a importância histórica de uma casa e as lembranças que tal ato faz reviver. E não passa disso esse filme. Um arquivo pessoal de luxo.


14º) Nem de Eva, nem de Adão - Jean-Paul Civeyrac



Antes de começar o filme, o próprio Cyveriac comentou que o filme se aproximava bastante do realismo francês. Mas eu achei um tanto quanto longe de tal corrente cinematográfica. Aqui as coisas acontecem a todo tempo, em um timing não muito bem estabelecido. Os atores, ainda jovens, não apresentam a capacidade dramática exigida pelos personagens. Mas os vinte minutos finais do filme conseguem ser melhores que o resto do filme inteiro.





13º) Redacted - Brian de Palma


A primeira coisa que veio à minha cabeça quando acabou o filme foi em como o de Palma havia sido preguiçoso em não ter feito um documentário sobre o tema. Geralmente, filmes de guerra, quando querem servir de denúncia, recorrem a tal formato. Quando há a vontade de fazer um filme de ação ou um drama de guerra, opta-se pela ficção. E Redacted fica no meio termo, algo entre o documental e o forjado, de forma meio intencional talvez. Mas no fim das contas, tudo soa meio falso. Falso como os documentos sobre a guerra são, verdade. Porém não como um filme de denúncia deve ser.

12º) Os Solitários - Jean-Paul Civeyrac

Superior ao primeiro trabalho do Cyveriac, e feito com um baixo orçamento, trata da solidão compartilhada por todos nós, expressada de maneiras tão diversas, e da necessidade de alguém que nos dê atenção constantemente. Só é utilizado praticamente um cenário durante quase todo o filme, que serve de palco para o relacionamento entre dois irmãos e as suas mulheres. Ótima interpretação da Lucia Sanchez como Alice.


11º) Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto - Sidney Lumet

Meu primeiro filme do Lumet. E, sinceramente, foi um começo pouco empolgante. O filme não consegue, quase em nenhum momento, ficar acima da mediocridade. Sinceramente. A trilha sonora é ruim. Salva-se apenas pelo elenco magistral [Albert Finney, sempre bom; Philip Seymour Hoffman e Ethan Hawke].

10º) Persépolis - Marjane Satrapi & Vincent Paronnaud

Animação francesa bem simpática, que conta aos olhos de uma menina todo um período histórico conturbado no Irã (como se algum dia as coisas naquele país fossem tranquilas). Indicado para concorrer ao Oscar 2008 como representante da França, tem grandes chances de ficar entre os cinco finalistas. Mas não merecia o prêmio do público na Mostra.
9º) Paranoid Park - Gus Van Sant


Gus Van Sant é um diretor para jovens. Era incrível a quantidade de pessoas entre 18 e 23 anos que se amontoavam na fila da bilheteria. Ele parece entender a complexidade e a solidão que acompanham esta fase da vida, tratando com beleza e precisão a vida adolescente. Abusa novamente da câmera lenta, dos longos planos-seqüência, e nos conta uma história sobre a culpa, sem cair no melodrama. O que fica é a impressão de que vai ser difícil superar Elefante.




8º) Tabu - F. W. Murnau


Não tenho muito o que falar desse filme. Murnau, mas conhecido por ser um autor do expressionismo alemão, nos entrega uma obra bem sólida e sóbria, sem espaço para características estéticas ou interpretativas fora do convencional. Mas não deixa de ser uma belíssima obra sobre o amor proibido.


7º) Senhores do Crime - David Cronenberg


Novo trabalho do Cronenberg, em sua segunda parceria seguida com o Viggo Mortensen, e melhor que o antecessor (Marcas da Violência). Apesar do Viggo estar bem, é o Vincent Cassel que rouba a cena, fazendo o filho do chefe da máfia, que mantém uma relação duvidosa com o seu protegido, papel de Viggo. A cena da luta na sauna é espetacular. Mas eu ainda acho o Cronenberg meio superestimado.

6º) Longe dela - Sarah Polley


Palmas para a Sarah Polley, que com o seu primeiro filme, aos 28 anos, conseguiu fazer um tocante estudo sobre o amor e a dor do esquecimento. O tema do filme é perigoso, com grandes chances de cair em situações piegas. Mas a Sarah foi competente também ao escrever o roteiro, e conta com interpretações inspiradas de Julie Christie e Gordon Pinsent. Filme para ver mais de uma vez, daqueles em que a empatia pelo personagem é tão grande que nos faz sentir junto a ele.


5º) A Retirada - Amos Gitai


Novo filme do Amos Gitai, utiliza como pano de fundo o conflito entre Israel e Palestina, mais precisamente a desocupação das colônias de judeus na Faixa de Gaza. A seqüência inicial do filme, em que um judeu e uma palestina flertam, é sensacional. Parece difícil falar desta região sem entrar em discursos políticos, mas aqui a força é do drama familiar. Uma mulher precisa reencontrar a sua filha em Gaza enquanto seu meio irmão comanda forças judias para a retirada dos colonos judeus. Mas as relações familiares aqui são meio incertas, assim como a verdade na questão da Terra Prometida. No mais, Juliette Binoche está assustadoramente velha, mas com tudo em cima.




4º) Lust, Caution - Ang Lee

Ang Lee se utiliza novamente dos moldes clássicos do cinema para fazer mais uma história de amor proibido. Mas aqui o classicismo é bem mais evidente do que em seu trabalho anterior, talvez pela história ser mais convencional. Grandes chances de possuir um grande número de indicações (entre trilha sonora, direção de arte, figurino, filme estrangeiro).


3º) Onde os Fracos Não Tem Vez - Joel Coen



Talvez a melhor obra dos Coen até aqui, o filme conta com um ritmo tenso do início ao fim. Era o filme que mais queria ver na Mostra, e como fã dos Coen, sou meio suspeito para falar. Mas o Javier Bardem nasceu para ser um psicopata, sua atuação está excelente. O filme consegue muito bem entrelaçar a história de todos os personagens com a do psicopata, e desde a primeira morte sabemos que qualquer um pode morrer a qualquer momento. De novo, um Texas de homens rudes, com uma secura que reflete a aridez da região. Mise en scène ou determinismo, os Coen são mestres em traçar um perfil do texano atual, num Novo Oeste ainda sem lei.



2º) A Questão Humana - Nicholas Klotz



Assustador. Um daqueles filmes que acaba e você não sabe o que faz. A sensação de impotência, a descoberta de uma verdade. Nicholas Klotz foi mestre na estruturação do seu filme e o roteiro é digno de nota 10. Acompanhamos a investigação de um presidente de uma empresa pelo psicólogo da própria empresa e o que parecia ser algo tão pontual vai adquirindo ares cada vez maiores, que envolvem o próprio espectador. E vamos descobrindo junto, nos descobrindo junto, pedaços de um sistema mais cruel que imaginamos, em que a questão humana, certas vezes, é fruto de um passado que queremos de qualquer jeito esquecer.


1º) I'm Not There - Todd Haynes

O primeiro filme que assisti na Mostra. E ocupou o primeiro lugar desde tal momento. Não gosto de usar o termo cinebiografia para este filme. Por mais que pareça isso, acho mais certo definí-lo como o retrato sobre um artista por outro artista. Uma obra de arte. Tal como Mona Lisa não é apenas o quadro de uma mulher.
Assim, lembra mais o trabalho de Tim Burton em Peixe Grande do que o de Taylor Hackford em Ray. Tanto autor como o personagem tem importância fundamental na construção da obra, pois o personagem torna-se ao mesmo tempo que real, impressão pessoal e neste caso, tranferível, de seu descritor.
Também foge da convencional linha dramática que as cinebiografias musicais adquirem. Aqui, o Haynes não quer nos fazer chorar com a história de Dylan. O que ele faz é apenas exprimir a sua visão sobre o cantor, livre de julgamentos morais aos quais estamos acostumados a participar. Tira de si e do espectador o papel de algoz. Ele sabe que não tem esse poder e é nesse ponto em que sai vencedor, e nos entrega uma obra prima.

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